O escritor costuma se desligar de tudo para ir atrás de seus temas com algum sossego. Assim, passa horas isolado, longe da pulsação que agita os dias e as noites – homens e mulheres se debatendo neles – e, num aparente contrassenso, busca dar corpo às intuições a partir da experiência ganha observando, bem ou mal, justamente esse frenesi do qual foge com todas as forças.
Por instrumentos: as palavras. Entidades esquivas em monocórdica disposição horizontal – uma atrás da outra simulando certa disciplina –, é nelas que o escritor se perde na busca da sonoridade mais bonita, do ritmo preciso e do melhor sentido. O desafio é desentranhar da absoluta abstração, inerente à escrita ficcional, alguma coisa parecida com uns pedaços do universo – átomos –, na forma de impressões dotadas de certa ordem interna, contendo um pouco de tudo.
Quanto aos assuntos, podem até se oferecer à imaginação com alguma facilidade mas o complicado não é chegar neles, mas sim ir acertando a forma de tratá-los no cuidado com a composição das frases e com o encadeamento dos períodos para poder atendê-los na medida certa. Porque, à diferença do músico, o escritor não possui nada parecido com um metrônomo que possa revelar a ele a cadência do texto. Precisa trazer o metrônomo para dentro de si e afiar o ouvido tentando descobrir o tempo mais adequado, sílaba por sílaba, palavra por palavra, frase por frase, período por período. Isso, quando a intenção for um certo domínio do texto, porque há escritores que se importam menos com ele preferindo se deter no assunto. Então ficam caçando situações inverossímeis e temas extraordinários indo atrás de aprovação por conta – quem sabe? – do inesperado. Ou tentando estruturas narrativas complicadíssimas, num desprezo evidente pelas vias mais simples testadas por tantas histórias que conseguiram bater bem no leitor, sem exigir que se esforçasse além do necessário para mergulhar nelas.
Agora, ao tipo de artista comprometido com questões como fluência, ritmo e sonoridade caberá domar seu meio com bota e espora, tornando claro que, ali, o campo das decisões é só dele. Por isso não poderá aceitar que os caprichos da língua escrita, veículo difícil e fugidio, se interponham entre a ideia e sua materialização. Como campeiro em potro bravo sustentando corcoveio precisará mostrar que nenhum imprevisto sonoro, nenhuma vizinhança malsoante entre o fim de uma palavra e o começo de outra irá fugir-lhe ao ouvido atento, desviando-o da meta de servir o tema com a melhor forma a seu alcance, na lida permanente e obsessiva com a inarredável imprecisão das palavras.